O Mal cortou o silêncio- Alexander Ribeiro

 



“ Que barulho foi esse ? “ ela acordou assustada. “que barulho ?” – perguntou Luís, seu marido. Luís dormia profundamente, pois seu sono era pesado. E quando dormia, não ouvia nada. “um som estranho, parecia um rosnado baixo, cheguei a ficar arrepiada”. “Ah, deve ser a porra do cachorro do vizinho. Não é nada, vamos dormir”, disse Luís, querendo acabar com o assunto e retornar ao seu sono. Mas Kátia, estava bem impressionada. “ Não, aquilo não era cachorro, parecia ser algo de outro mundo. Foi muito estranho. È melhor ir lá ver “ Luís se irritou “de outro mundo ? haha! Você está brincando né ? Esquece isso e vamos dormir, que eu tenho que acordar cedo .” “pode dormir, que eu não preciso de você pra nada. Deixe que eu vou lá !” respondeu Kátia, irritada, e já se levantando. “Ah, vai! Vai lá caçar fantasma e me deixa dormir! Hahaha” Kátia lançou um olhar de revolta para o marido, que já tinha se coberto e virado de costas para ela. Nessa hora se perguntou mentalmente: “ o que diabos, estou fazendo com esse idiota ?”  Então, ela saiu do quarto, sorrateiramente, e foi descendo lentamente a escada, tomada pelo medo. Tinha se mudado para aquela casa há 2 meses. Foi idéia do marido, que queria morar perto do trabalho. Quando estava terminando de descer as escadas, ouviu outro rosnado baixinho na direção da sala. O medo tocou sua espinha, gelando todo o seu corpo, como se um iceberg estivesse se materializado dentro dela. Ela então paralisou e ficou olhando em volta, tentando achar o ser que emitia aquele som. Não o viu e então foi andando rápido ate a cozinha e acendeu a luz. Olhou em volta e não viu nada. Olhou embaixo da mesa de centro para ver se a coisa não se escondia lá embaixo. Mas não viu nada. Pegou uma faca de carne para se proteger e foi andando sorrateiramente ate a sala.

Era estranho, mas parecia que o ar estava mais pesado no cômodo. Chegando lá não viu nada, mas ouviu passos no chão, passos que não eram humanos. Vinham de debaixo da mesa. Ela se abaixou para olhar e viu um vulto. Acendeu a luz do celular, e direcionou-a para a coisa. Viu que era uma estranha criatura que parece um cachorro e que não tem olhos na cara, mas tentáculos saindo das órbitas oculares. Parte do peito e da barriga tem os ossos a mostra. O pêlo, onde tinha, era um preto desbotado, quase cinza. E o tamanho e o formato da cabeça lembravam um cão da raça Dobermann. Ela paralisa diante da visão macabra, e imediata-mente sua pele fica esbranquiçada pelo pavor . A criatura rosna baixinho e a encara, enquanto a baba escorre de sua boca. O estranho ser começa a armar um bote e ela pensa em correr, mas fica com medo dele saltar em cima dela, caso o faça. Pela visão periférica, ela vê que há uma luz que remete a fogo, vinda da despensa, e imagina que ali há um portal para o inferno é que o ser veio do “andar de baixo “.

Então, apavorada, ela resolve correr o mais rápido que já correu na sua vida em direção a cozinha. Ela corre e a cada passo que dá, o rosnado do ser fica mais alto, indicando que está se aproximando dela. Quando ela entra na cozinha, rapidamente fecha a porta e vira o trinco, e antes de soltar a maçaneta, sente o impacto do “cão do outro mundo” saltando na porta. O animal começa a dar cabeçadas e a arranhar a porta com as unhas, até que a porta fura. Kátia consegue ver o tentáculo ocular do animal passar pela porta, envolver o trinco e começar a girá-lo. Então, sem pensar duas vezes, ela sai por uma porta que tem na área de serviço, e pega uma vassoura que está do lado de fora, e a coloca na diagonal sobre a fechadura, para bloqueá-la por tempo suficiente, para que ela possa fugir.

Ela corre para a casa do vizinho e começa a tocar a campainha, desesperadamente. Como eles demoram a atender, ela começa a gritar. De lá olha e vê que o cão está investindo contra a porta e que esta não vai demorar muito a ceder. Ela grita mais vezes Mas de repente sente uma pancada por trás de seu joelho, e vai ao chão, segurando-o e gritando de tanto que dói. Ela olha para cima e vê alguém e não identifica facilmente devido a dor que atordoa seus sentidos. Mas em alguns instantes, reconhece a face diante de si. Era a vizinha Esther. Ela diz calmamente : “Desculpe, querida, mas ele precisa se alimentar.”

Nesse instante, ela escuta o som da voz de seu marido vinda da casa. Ele grita ”Mas que porra é essa ?” e de repente o som do cão arranhando a porta cessa. E se seguem sons da criatura rosnando e de seu marido gritando em agonia. Ela, com a pena quebrada no chão, não pode fazer nada a não ser gritar o nome de seu marido e chorar enquanto ouve o som do ser devorar a carne do seu marido com voracidade . 

Depois de se alimentar, a criatura arrebenta a porta num salto, o que evidencia que agora está mais forte. Ele vem correndo para devorar Kátia. Esther se afasta de Kátia e continua ali perto, sem medo nenhum da criatura, como se tivesse a certeza que não corre riscos. Outros vizinhos da rua estão em frente a suas casas observando a situação serenamente, como se aquilo fosse algo comum ali. A criatura abocanha o pescoço de Kátia e puxa até a jugular começar a sangrar. Kátia, diante da morte iminente e sentindo muita dor acaba urinando nas calças. A criatura continua devorando-a, se alimentando de suas tripas. Sua vida vai se esvaindo aos poucos e quando uma grande poça de sangue surge ao seu redor, ela está morta.

Os vizinhos se aproximam calmamente. O cão, agora alimentado, fita-os. Eles se põem lado a lado e se curvam no chão em reverência ao ser. Como se entendesse o significado do ato, ele só sai dali quando as pessoas se levantam novamente. Ele, então, vai correndo para a casa e entra na despensa onde está aberto um círculo no ar, de onde emana a luz amarela do fogo do inferno. Ele salta no portal, que se fecha atrás dele. Diante de Esther, os vizinhos fazem um mutirão para se livrarem do corpo de Kátia e apagar todos os rastros do chão. Esther, a líder do grupo, distribui ordens a cada um. Luíza, uma vizinha loira de uns 50 anos pergunta a Esther: “Quantos sacrifícios faltam ?” Esther responde :”apenas 5”. Depois de duas horas coordenando toda a operação, todos vão pra casa. Esther entra por sua porta e se dirige ao seu quarto. Tira toda sua roupa e liga o chuveiro no quente. Enquanto a água esquenta, ela vai até o seu armário e afasta todas as camisas. Atrás há um fundo falso, que ela abre empurrando uma placa de madeira para a direita. Dentro, há um quarto com um pentagrama desenhado no chão e a imagem de belzebú nas sombras. Ela se senta no centro do círculo e começa a acender velas nas extremidades. Ela então olha nos olhos da imagem e diz : “falta pouco para a Terra ser toda sua, meu senhor. Então ela começa a entoar um sinistro cântico enquanto esboça um sorriso de satisfação. Ela estava radiante.

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